26/12/10

hoje decidi imprimir a minha vontade


Já não me encontrava há algum tempo sentado [de frente para esta máquina de escrever] de um modo tão calmo e sereno como hoje. Já há certo tempo que não conseguia pensar tão claramente sobre o que me tinha acontecido. Fora uma viagem inesquecível mas que terminara agora. Estava na altura de arrumar a mala e as gavetas das mesinhas de cabeceira. Era tempo de voltar a fechar as janelas e as cortinas para que a potente luz solar [do dia seguinte] não corrompesse o resto de alegria que restava nas paredes daquele quarto [listado de branco e borboletas negras]. Peguei na mala e julguei estar mais pesada do que era devido. Logo vi que iria transportar daquele lugar mais do que era pedido. Logo vi que comigo virias tu. Senti o peso da mala a percorrer o meu braço e arrastei-a até à porta do quarto. Rodei a chave e abri-a num movimento lento e seco. Quase que viscoso e temporalmente em estase.Olhei uma última vez para o fundo do teu quarto e saí. Viajei para longe e regressei ao meu lar. Aqui me estabeleci de novo e tentei a todo o custo desfazer-te da minha mente. Insisto em querer não conseguir.
Hoje ao sentir o frio metálico desta máquina apeteceu-me dizer que já não te amo. Peguei num cigarro velho que tinha em cima da mesa e acendi-o. Puxei pelo seu fumo, menos letal que o teu amor. Fechei os olhos durante três segundos e meio e comecei a escrever. Dizem que o que escrevemos de forma escondida é sempre verdade. Será isso verdadeiro? Quero que seja. Mesmo assim, deixo o meu registo nesta folha amarelada onde vejo as teclas bater. A cada batida, a porta do teu quarto fecha-se novamente. Fico então à espera que nunca mais se abram enquanto o preto da tinta permanecer nesta folha.

Porto, 26 de Dezembro
Lipincot

Sem comentários: