28/01/11


Volto a receber-te em toques ligeiros de limão ácido sobre feridas ulceradas. A dor é algo que não faz parte do meu vocabulário aprendido e condicionado por ti. Algo que não te consigo descrever em palavras objectivas, brilhantes e distantes.
A dor é quando me deixas e queres voltar. A dor é quando eu reconheço (in)conscientemente que  o que sentia por ti, e por nós, acabou evaporado. És aferência dolorosa e constante. A dor é ter-te sempre ao meu lado.

Ainda com os olhos semi-abertos combinamos encontrar-nos ali na praia. Café matinal com cheiro a sal e sol de inverno. Com o oceano a espumar-se contra as ondas, ouviste o que quis dizer e disseste-me o que não queria ouvir. Trazes-me sempre de volta ao chão da razão e juízo. Deixas-me voar por instantes – sentindo a emoção – mas sem deixar chegar alto de mais, com medo da tua própria queda.

22/01/11

--construção

Desconstrução #2

É por baixo de um tecto atapetado que nos encontramos em mera conversa circunstancial. O local é claramente asiático e nas pequenas mesas colocadas à nossa frente, pequenos objectos prateados ostentam carnes quentes. A menos de meia-luz e absortos nos fumos do tabaco fumado por outros. Sentaste-te ao meu lado naquele sofá castanho que se afundou ainda mais contigo. O tecido do sofá era perceptível através das minhas calças. Conseguia-o perceber gasto e rasgado. Não éramos os primeiros naquele local. Foste falando comigo e o teu sorriso depressa tomou dimensões que desconhecia. Falaste-me das tuas viagens à Europa Oriental e como conseguiste fotografar os edifícios marcados pela história e de como conseguiste provar as especiarias capazes de dar ânimo a todo aquele povo longínquo. Havia algo em ti que não consegui perceber e figurar de forma objectiva. A nossa conversa continuou e foste-me cativando de uma maneira suave e imperceptível no momento. Algures entre o sexto ou sétimo cigarro o meu telefone tocou. Devia ter ignorado e nunca ter atendido. Devia ter vincado preferências naquele momento, naquele local e naquela altura. Não o fiz. Ao atender deixei os teus países e, como que em surto psicótico, regressei à baixa portuense. Despedi-me com um beijo e voltei-me para ti. Tu – que não desconfiavas sequer da viagem que me proporcionavas – continuaste com os teus contos, mas apartir desse momento fiquei incapaz de viajar, de novo, contigo. A partir desse momento tudo o que se construiu foi um simples planar teu em redor de mim – preso ao mesmo chão de hoje. Quero que saibas o quanto me arrependo de não ter aberto asas de novo e de ter planado livre e tranquilamente contigo.

N.G.
Porto, algures entre Outubro de 2007 e Janeiro de 2009

Desconstrução #1

Há muito tempo que reconheço o meu fracasso. Sinto, apesar de toda a racionalidade que consigo aplicar à questão, que tenho um problema. Não estou a conseguir lidar contigo, com o teu amor, com os efeitos que tens em mim. São tempos negros e bipolares que me enfrentam todos os dias de manhã. Tento recusar-me a escrever porque não quero uma memória do que se está a passar firmemente gravada nas minhas escritas. No entanto, num acto desesperado de ajuda, recorro ao meu local de escrita e deixo-me derreter em palavras que, de uma forma muito básica, acabam sempre por dizer o mesmo. Não tenho ambições de que os leitores me aplaudam ou me deixem ramos de flores. Ambiciono ver-me estratificado, escrito e concretamente planeado num pedaço de folha digital. Acham que tal pode ser concretizavelmente possível?